.: Treinamento e Desenvolvimento

Dê Feedback à Pessoa Certa 
Quando eu estava no primeiro ano do curso de Engenharia, tive um professor de Cálculo Diferencial que desagradou a mim e a meus colegas desde o início. O motivo era que ele não seguia o programa oficial da disciplina. Ele parecia decidir os temas a serem
Quando eu estava no primeiro ano do curso de Engenharia, tive um professor de Cálculo Diferencial que desagradou a mim e a meus colegas desde o início. O motivo era que ele não seguia o programa oficial da disciplina. Ele parecia decidir os temas a serem lecionados em cada aula com base em algum critério que só ele conhecia, e esses temas não formavam um conjunto coerente. Começamos a ficar preocupados e irritados. Depois de algumas semanas, decidimos levar a situação ao conhecimento do gestor do curso. Antes que fizéssemos isso, porém, para nossa surpresa, aquele mestre, no começo de uma aula, pediu-nos desculpas e prometeu seguir o programa a partir daquele momento. Algum companheiro nosso tinha lhe revelado nossa intenção de reclamar junto ao gestor. Não sabíamos quem tinha sido mas ficamos frustrados e revoltados com a traição. Naquele instante, não conseguimos perceber que o ato de nosso colega produziu exatamente o efeito que buscávamos sem que o caso fosse levado à coordenação. O problema fora resolvido diretamente entre alunos e professor.

Mais recentemente, trabalhei em uma instituição do governo como Assistente de Diretoria. Certo dia, eu estava reunido com um dos diretores, de nome Henrique*, em sua sala. A porta da sala estava aberta. Em dado momento, chegou Luiz Carlos*, o Gerente Financeiro. Ele entrou sem maiores cerimônias e, sem pedir licença, interrompeu nossa conversa, começando a falar com o diretor sobre o assunto que o levara até ali. Henrique respondeu disfarçando a má vontade e a irritação. Depois que Luiz Carlos saiu, ele falou para mim:

- Quem esse cara pensa que é para entrar desse jeito na minha sala e me interromper? Ele tá me enchendo a paciência faz tempo! Vou falar com o Edson! (Edson* era o Diretor Administrativo, a quem eu era vinculado, e superior imediato de Luiz Carlos).

Na hora não falei nada. Voltei para minha sala e, depois de meditar alguns minutos, retornei à sala dele.

- Henrique, disse eu, se você falar com o Edson, pode ser que ele repreenda o Luiz Carlos. Se ele fizer isso, você terá conseguido o que quer mas terá arruinado sua relação com o Luiz. Eu acho que ele não faz por mal. Você podia falar diretamente com ele em vez de falar com o Edson. Se você fizer isso, eu acho até que o Luiz Carlos vai tomar um susto porque ele nem percebe que está sendo mal educado. Também acho que ele vai lhe pedir desculpas.

O que o Henrique fez? Nem uma coisa nem outra. Continuou na mesma situação, ruminando a raiva que ele tinha do Luiz Carlos e evitando o contato com ele.

Qual a semelhança entre as duas situações? Ambas retratam uma atitude comum das pessoas. Quando alguém nos incomoda, nossa tendência é reclamar com o chefe daquele que nos agride ou então não fazer nada até o momento em que não agüentamos mais e explodimos, partindo para a briga com o agressor.

Por que não damos feedback diretamente a quem nos agride? Talvez porque a agressão nos humilha e reclamar com o agressor significaria passar recibo da humilhação. Para restaurar a dignidade arranhada, nossa tendência é dar o troco sem prévio aviso, queixando-nos ao chefe imediato do imbecil ou partindo logo para o revide. O problema é que, embora as duas alternativas satisfaçam nosso ego, ambas arruínam para sempre a relação com o outro.

Tive oportunidade de praticar o feedback direto na mesma entidade governamental que acabei de mencionar.

Como disse acima, eu era assistente de Edson, o Diretor Administrativo. Sua secretária chamava-se Rosana*. Certa vez, quando pedi educadamente a ela que me fizesse um certo trabalho, ela respondeu:

- Faça você, isso não é trabalho meu!

O sangue me subiu instantaneamente à cabeça e eu estive próximo, muito próximo de xingá-la com os piores palavrões. Apesar de sua falta de educação, porém, consegui me conter, voltei para minha sala e sentei para esfriar a cabeça. Eu precisava do auxílio de Rosana e tinha certeza de que dar suporte a mim fazia parte de suas atribuições. Eu podia obrigá-la a fazer o trabalho. Bastava ameaçá-la ou falar com o Edson. Mas eu não queria fazer nem uma coisa nem outra. Eu queria que ela mudasse de idéia. Comecei a pensar numa saída.

De repente, a ficha caiu. Percebi que Rosana reagiu daquela maneira porque talvez tivesse pensado erradamente que eu queria ???dar uma de chefe???, que eu queria dar ordens a ela sem ser seu superior. Imaginei que, como conseqüência, ela talvez tivesse se sentido humilhada e esse sentimento fosse a causa de sua reação.

A outra suposição que fiz foi que Rosana talvez acreditasse realmente não ter obrigação de me dar suporte, enquanto eu pensava o contrário. Estávamos, portanto, em um impasse, e esse impasse tinha que ser resolvido por alguém. Esse alguém só podia ser Edson, o diretor.

Com esse diagnóstico em mente, descobri o que eu tinha que fazer para que Rosana mudasse de atitude. Fui até sua mesa e lhe disse:

- Rosana, eu pedi a sua ajuda não porque eu queria dar uma de chefe. Eu não lhe pedi suporte porque gosto de lhe dar ordens. Também não foi por capricho nem para humilhar você. Eu lhe pedi para você fazer aquela tarefa porque eu preciso da sua ajuda e porque não tenho ninguém mais a quem recorrer. Eu pedi a sua ajuda porque preciso terminar um trabalho que não é para mim, é para a empresa. Se você não me ajudar, a empresa é que vai ser prejudicada.

Fiz uma pausa e observei sua reação. Ela ficou vermelha de vergonha. Percebeu naquele instante quanto tinha sido infantil e mesquinha e como sua atitude tinha sido não profissional, uma atitude não condizente com sua posição de assistente de um diretor. Continuei.

- Você pensa que não é sua responsabilidade me dar suporte administrativo e eu penso que é. Isso quer dizer que nós temos um problema e alguém precisa decidir essa situação. Eu vejo três alternativas para resolver o impasse: (1ª) eu vou perguntar ao Edson se é ou não sua obrigação me dar suporte; (2ª) você vai fazer essa pergunta ao Edson; (3ª) nós dois vamos perguntar ao Edson. Pode escolher. Pense no assunto e depois me diga o que você resolveu.

Voltei para minha sala. Pouco depois, ela foi até mim e disse:

- Flavio, pode me dar o trabalho que eu vou fazer.

Ela não tinha escolhido nenhuma das três alternativas. Ela apenas resolveu me atender.

Ao dizer a Rosana que havia um problema, que nós estávamos em um impasse e que havia três alternativas de solução, eu lhe dei a possibilidade de escolher. Porém, mesmo sem falar nada, também lhe dei a oportunidade de voltar atrás, de reconhecer que estava errada e de mudar seu comportamento por sua própria iniciativa, sem a humilhação de ser repreendida pela chefia. Ela aproveitou a oportunidade. O principal, porém, é que o desfecho da situação fez com que eu me sentisse vencedor e, mais do que isso, desagravado.

Reconheço que é difícil nos contermos quando somos humilhados. Também devo ressaltar que dar feedback ao ofensor só faz sentido quando este tem boa índole e nos ofende sem querer. Quando decidi falar com Rosana de forma educada, eu parti da premissa de que ela era uma pessoa de bom caráter e que não tinha tido a intenção de me humilhar. O fato de minha estratégia ter dado certo mostra que minha premissa estava correta.

*Nomes fictícios

Flavio Farah, mestre em administração de empresas e professor universitário, é autor do livro ética na gestão de pessoas.

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Denise Rodrigues do Amaral é escritora, com mais de 450 artigos publicados nas áreas de business & lifecoaching (motivação e empreendedorismo), centrada no fator humano como instrumento de sucesso pessoal, profissional e empresarial. Colunista do Portal Brasil (business & life coaching). ?? advogada e também graduada em Comunicação pela Universidade Mackenzie, pós-graduada em Teoria da Comunicação pela Fundação Cásper Líbero, na área de comunicação e produtividade. Foi Consultora em Comunicação Empresarial e Relacionamento Profissional do Centro de Orientação, Atualização e Desenvolvimento Profissional (COAD). Diretora Administrativo-Financeira da Advocacia Rodrigues do Amaral e autora do livro Crianças podem voar Ed. Internacional